terça-feira, 25 de maio de 2010

Crônica para além dos olhos


Entre indas e vindas minha sombra me faz companhia pelas frias manhãs azuladas às noites enluaradas.Passos traiçoeiros circundam melodias pastosas no quarto fechado.
Na janela ao lado vejo um vulto feminino passar de um lado pro outro e a cortina esvoaçante encobre a visão.
Era ela, sentada com as mãos sobre a face,chorava penosamente e seu pranto me fez pensar
o porquê de toda a situação.Acendi um cigarro com a xícara de café que esfumaçava,peguei um livro e tentei tirar o pensamento daquela imagem que tanto me afligia.
Adormeci sem sentir,logo ao acordar me veio a imagem daquela mulher que estava aos prantos
na noite passada.
Levantei da cama,joguei uma água no rosto,passei um café e enquanto isso com os dedos
entreabri a cortina lentamente para ver se avistava algo pela janela.
Era uma manhã de inverno fria que congelava até o pensamento.Fiquei ali por alguns minutos
esperando algum reação ou qualquer barulho que fosse,mas nada aconteceu,nem um murmurinho sequer.
O dia crescia tomando ritmo com as horas que seguiam e eu ainda não avistara nada
nem ninguém ali desde o ocorrido.
Como de costume comecei a dar partido nos afazeres diários.Com a vassoura nas mãos e o rádio ligado,eu ia cantarolando as músicas.De hora em hora espichava os olhos de curiosidade sempre em alertar a qualquer sinal , por menor que fosse.
A noite veio e eu ainda continuava a me perguntar qual o motivo de tanta tristeza.
Eu não a conhecia.Sabia apenas que a sua janela dava de frente a minha,que determinada hora da noite se sentava de frente ao computador e que assistia a novela com o volume alto e ainda não satisfeita conversava entrando em ferronhas discussões com os personagens como se os conhecesse de longa data.
Os dias passaram voando,as minhas responsabilidades dobraram,os compromissos triplicaram e logo me esqueci do ocorrido.
Certo dia antes de sair de casa encomendei ao floreiro rosas vermelhas suculentas para o adorno
e para que perfumassem a casa,como sempre fazia.
Quando voltei dos compromissos,acendi as luzes,adentrei o quarto e depois fui tomar um banho
para aliviar o cansaço do corpo de um dia tão intenso.
Estava trabalhando em algumas músicas ,então me sentei com o violão e quando menos esperava escutei um barulho.
Corri pra janela e fui ver o que estava acontecendo,o que seria aquele furdunço.
Vi uma belíssima mulher que de frente ao espelho chorava se contorcendo entre caras e bocas.
Percebi logo que se tratava de uma atriz ensaiando suas falas e diante aquela situação toda cai em gargalhadas até perder o fôlego.
Sempre que relembrava o fato ria ,liguei aos amigos mais próximos para contar o desfecho
e cai no riso escrachadamente.
No dia seguinte ao sair,coloquei uma rosa com um bilhete enfrente a sua porta com os seguintes dizeres:


"Para atriz,atos...
Para quem imagina,fatos.
Para quem vivencia,sonhos."

Depois desse ocorrido não avistei mais aquela mulher de beleza exótica,traços fortes e gestos compostos.Passei alguns dias viajando e logo em seguida acabei me mudando para outra cidade.Mas comigo levei essa história e a interação de que nem sempre o que vemos,é aquilo que de fato é.

(Jú Fernandes - 13/05/2010)

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Leve como um vestido ao vento


O mundo tece fios de esperança nessa nova era que se aproxima.
As cores e formas são tão nítidas.
Confortável,essa é a palavra que sustento com delicadeza.
Quero viver incansavelmente feito bolha de sabão no céu azul.
Transparente,livre,brilhante, sempre em direção ao infinito
de oportunidades que é dispostos no ar.

Mas o que me atrai são as luzes soltas na retina
e a sinceridade na atitude.
Na vitrine da vida,sou manequim bem vestido
que acompanha os pedestres atentos de perto.

E quando menos espero...
sinto que são arrepios que se espalham pela pele.
Aderi a tal moda de vulcão,
transbordo pelas veias e trago à tona
a felicidade na erupção do sorriso.

Estou leve,como um vestido ao vento ...
e essa plenitude que me encanta
Assim descobri que sou capaz de ser o mundo.
Afinal, ter o mundo só pra mim seria egoísmo demais.

sexta-feira, 14 de maio de 2010


"Escrever nem uma coisa Nem outra -
A fim de dizer todas
Ou, pelo menos, nenhumas.
Assim,
Ao poeta faz bem
Desexplicar -
Tanto quanto escurecer acende os vaga-lumes."

(Manoel de Barros)

Senhor,fazei-me instrumento de vossa paz



Senhor,
fazei de mim instrumento de vossa paz.
e que eu encontre primeiro, em mim,
a harmoniosa aceitação de meus opostos.

onde houver ódio, que eu leve o amor.
aceitando o ódio que possa existir em mim e compreendendo todas as faces com as quais o amor pode se expressar.

onde houver ofensa que eu leve o perdão
e que me permita ofender para ser perdoado

onde houver discórdia que eu leve a união.
e que eu aceite a discórdia como geradora da união

onde houver dúvidas que eu leve a fé.
podendo humildemente, encarar minhas próprias dúvidas

onde houver erros, que eu leve a verdade.
e que a "minha verdade" não seja única, nem os erros sejam alheios.

onde houver desespero, que eu leve a esperança.
e possa, primeiro, conviver com o desânimo sem me desesperar.

onde houver tristeza, que eu leve alegria.
e possa suportar a tristeza minha e dos outros sendo alegre ainda assim.

onde houver trevas que eu leve a luz.
após ter passado pelas "minhas trevas" e ter aprendido a caminhar com elas.

oh, divino mestre...
fazei que eu procure mais: consolar que ser consolado.
e que eu saiba pedir e aceitar consolo quando precisar.

compreender que ser compreendido,
e me conhecer antes, para ter melhor compreensão do outro.

amar que ser amado,
podendo me amar em princípio,para não cobrar o amor que dou.

pois é dando que recebemos.
e sabendo receber é que se aprende a doar.

é perdoando que se é perdoado.
e não se perdoa a outro enquanto não há perdão por si mesmo.

e é morrendo que se nasce para a vida eterna.
e é bem vivendo e amando a vida que se perde o medo de morrer!

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Assim...



P.S.: saudades desse meu violão de aço,desse meu companheiro nos meus passos...

Motivo – Cecília Meireles

Eu canto porque o instante existe

e a minha vida está completa.

Não sou alegre nem triste:

sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,

não sinto gozo nem tormento.

Atravesso noites e dias

no vento.

Se desmorono ou edifico,

se permaneço ou me desfaço,

- não sei, não sei. Não sei se fico

ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.

Tem sangue eterno e asa ritmada.

E sei que um dia estarei mudo:

- mais nada




A alienação é demasiado doce (como um refrigerante) e a liberdade demasiado amarga, porque está demasiado próxima da solidão. E da loucura” - Manuel J. Gomes



Confissões Ácidas



Coração,sei que você não tem culpa,mas caímos na mesma ratoeira!
É como se na minha face estivesse estampado aquele meio sorriso besta.
Minha retina quer captar uma constante que é opaca,
que não tem luz suficiente pra trazer à tona a percepção necessária.
As pessoas banalizaram o amor,fizeram dele apenas um passa-tempo
e a cada esquina que cruzo eu vejo menos possibilidades.
Não que eu seja retrô,mas hoje em dia o flerte não é fatal,
é apenas animal e isso me fatiga.
Pessoas mal resolvidas com assuntos inacabados,corações destruídos,
olhos esbugalhados e tendências retrógradas.
Fantoches da oportunidade que se mascara no risco!
Não há como alertar,entretanto o festival de fracassos é evidente.
Creio que pra tudo tem seu tempo,as vezes num segundo se constrói
uma eternidade...mas sei lá...
Estou farta de abobrinhas psicodélicas e filosofias de buteco.
Estou cansada e não pretendo me deteriorar tão cedo,mas até as
palavras tem andado escassas e eu não gosto disso.
Nem sei porque estou escrevendo isso,mas é necessário cuspir
as coisas entaladas na garganta que acho ridículas.
Deus me perdoe!
Mas cadê o romantismo?
As pessoas simplesmente mandam o sentimento pra dentro
de uma vala e o mundo que se exploda não é?
...
As vezes acho que nasci na época errada!


* *



Ao som de Casa no Campo - Elis Regina

Eu quero uma casa no campo

Onde eu possa compor muitos rocks rurais

E tenha somente a certeza

Dos amigos do peito e nada mais

Eu quero uma casa no campo

Onde eu possa ficar no tamanho da paz

E tenha somente a certeza
Dos limites do corpo e nada mais

Eu quero carneiros e cabras pastando solenes
No meu jardim

Eu quero o silêncio das línguas cansadas

Eu quero a esperança de óculos

E um filho de cuca legal

Eu quero plantar e colher com a mão

A pimenta e o sal

Eu quero uma casa no campo

Do tamanho ideal, pau-a-pique e sapé

Onde eu possa plantar meus amigos

Meus discos e livros e nada mais!

Onde eu possa plantar meus amigos

Meus discos meus livros e nada mais!

Onde eu possa plantar meus amigos

Meus discos e livros e nada mais!

terça-feira, 4 de maio de 2010

Ah...Vida Caduca!


Ah...Vida caduca!

Eu vou sair por aí agora
Atrás de uma aurora mais serena
As vezes não vale a pena despertar
Meu choro é coisa pequena
Mas roubado a duras penas do coração
Não me olhes assim,não preciso ser feliz o tempo todo
O sinal está fechado mas meu coração ainda não parou
Meu corpo está sofrendo e é grande o meu torpor
contudo sem meus ossos,meu vulto perde a cor
Lançai-me no tempo de uma oração
Deus fica zangado vendo algo assim
Opaco é o fim do mundo pra quem canta sem amor
Preciso de um cais para os olhos
O copo está vazio,cansei de saciar minha sede em metáforas
Por vezes a vida se assimila a uma comédia romântica
só que eu ainda acredito em anjos e carrego meu violão comigo
Tenho sentimentos escandalosos e indiscartáveis
E agora eu ando tanto
procuro aquele novo lugar
Um cúpido cochichou pra que eu andasse entre as nuvens
em busca da nascente de um sonho corrente
Sem doublés apenas fecho os olhos
pego carona na rabiola de uma pipa
e vou...

(Jú Fernandes)


P.S.:
Inspiração dedicada aos Chicos,Buarque e César, e Chopin the Nocturne
que me fizeram companhia durante o transcorrer.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

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Sem alterar o tom ou o teor,
resolvi acrescentar sabor.
Não sou nada indelével,
assim como as luzes da cidade
ou um cobertor no frio.
Livre pra amores sobre o mar de estrelas,
mato a sede na ascensão do sorriso.

Não gosto de outonos escassos.
E se no meu canto surge o grito é porque em
mim tem um "muito" que transborda.

Depois de tantas retalhações,
vi que bastava apenas atravessar a rua.

Um pouco atribulada
mas por hora um tanto quanto singular.
Assim como amizade na infância,bolo de chocolate com cobertura
e refrigerante gelado com batata frita...

Pra mim : "O momento que se eterniza é aquele que fica."