Deixo a vida acontecer do jeito que tem que ser

 (Ovo Cósmico - Salvador Dali)

Fecho os olhos ,respiro fundo e solto ar como se despejasse pra fora algo desconfortável;
Vejo o mar e me perco nele do mesmo jeito que ele se perdia em mim, inundando meus olhos de lágrimas de mar,assim como eu inundava o mar com minhas águas marítimas de lágrimas.
Talvez no fundo tenhámos a mesma consistência.
Talvez o que nos invade seja a mesma substância.
Nesses dias de respiração curta e pouco sono é que eu consigo ver as coisas com mais nitidez ao meu redor;
E sinceramente, talvez as coisas não tenham o mesmo impacto de antes.
Nunca vivi uma primavera tão sombria de tons úmidos.
Mas não é isso que me assusta,pois do meu própio veneno eu crio o antídoto necessário para tais pensares exauridos.
"Bad hours"..."Bad days"...Bad ?!...
Acredito que pra tudo na vida existe um propósito,desde a quinquilharia encostada no fundo do armário até a o canário que canta um estribilho agudo em semi-tons e me faz olhar pra ele.
Saculejo meus pés,aperto meu olhar míope pra ver ao longe dessa manhã fria e um tanto quanto abstrata.
Observo e talvez seja esse ar bucólico que me teletransporta a lugares inabitavelmente desconhecidos.
Sim, a vida é aventura errante com espectativas frustrantes as vezes, uma descoberta constante,uma busca incessante pela satisfação.
Uma caça ao consumismo impalpável...para outros apenas uma conta bancária.
Não gosto de dias monocromáticos,minha vida é tecnicolor; as vezes as avessas se desgasta pelos absurdos alheios.
Meus braços viram travesseiros,neles quieto minha cabeça ( à propósito meu pensar) para sentir o meu coração pulsar,para saber do meu ritmo,para entender as coisas,os dogmas,paradoxos e algumas proezas que nunca vieram a tona.
Um deslocamento de ar na dinâmica do meu tempo me chama atenção,corro até o parapeito...
Centenas de pássaros em revoada dançam no céu fazendo reverância a essa manhã,nasce um sorriso.
Talvez seja a natureza, talvez seja da minha natureza.Talvez eu não saiba sustentar "bad feelings" e no final tudo se transforme apenas em canção.Em oração canto pra alma essa  extraordinária composição de Oswaldo Montenegro e deixo a vida acontecer do jeito que tem que ser.

Metade

Compositoção: Oswaldo Montenegro

Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio

Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.